ALBERTO BITTENCOURT - Palestrante, motivador, consultor, escritor, biógrafo pessoal

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ALBERTO BITTENCOURT - Palestrante, conferencista, motivador, consultor, escritor, biógrafo pessoal

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

AEROPORTO



Capítulo I

Novembro de 2006

Multidões desoladas vagueiam a esmo pelos saguões dos nossos aeroportos. Aqui, como nas mais importantes cidades do Brasil, humildes e anônimos trazem o semblante desesperado das buscas inúteis, das esperanças diluídas nas intermináveis esperas, dos instantes sempre adiados, das inúmeras desculpas, da hora que não chega. Rostos crispados, tensos, refletem angústia e sofrimento. A lua de mel termina no aeroporto. O estresse volta a tomar conta do casal, após uma semana de encantamento e beleza. O que se vê são reclamações, choros, revoltas, inconformados todos com esta situação. Aqui e ali se instala uma discussão. Gritos, pressão, paixão. As horas passam a fio e nós, no saguão. Horas infindas, noites insones, não há acomodações e nem mesmo podemos nos afastar para um lanche, uma refeição mais tranquila, ou para uma higienização, um banho tão sonhado. Deixar a bagagem só? nem pensar!

Cadê o amor? Onde foi parar a solidariedade?

Só há falta de informação. A ninguém é dado conhecer a resposta.

Até quando? _ Eis a questão. O que está havendo? _ Ninguém parece saber.

O caos, o descalabro assolam os setores públicos do país. Onde está o Brasil de ontem, alegre e tranquilo? O aeroporto virou o retrato da bagunça geral que a acomete o país. No caos, a explosão. Após a explosão o recomeço.

Este país tem jeito? _ Só se começar tudo de novo.

Só agora se soube: a situação já vinha crítica de longa data, aviões quase se chocaram em várias ocasiões. Foi preciso um grave acidente para fazer aparecer a realidade, nua e crua. O que fora considerado o meio de transporte mais seguro, mostrou sua natureza frágil e humana, fruto de um país que não sabe para onde vai e, principalmente _ como vai e aonde quer chegar. Um país que marcha no mesmo lugar há mais de 25 anos, sempre repetindo a mesma história, a velha incompetência do Serviço Público. Pobres de nós, brasileiros, sem eira nem beira, pobre república, que velha ou nova, nunca funciona. Humildes e anônimos, nada somos, pobres de nós que dependemos deste “serviço público”: de escolas, de hospitais, de moradias populares, de segurança.

Ai de ti, viajante de segunda categoria, teu destino é sofrer! Pobre nação dos humilhados, dos sem tudo, dos sem nada.

Amanhã será outro dia! _ Mas esse amanhã nunca chega. Brasil do eterno amanhã.

O irascível homem de negócios perdeu importante reunião.

O congressista não conseguiu chegar a tempo para ministrar sua conferência.

O transplante não pode ser realizado, pois o órgão ficou retido um tempo superior ao que poderia suportar.

A intolerância passou a ser a palavra de ordem, resposta humana ao caos. Só esta palavra define melhor a situação: DESCALABRO.

Descalabro na crise que não acaba, descalabro governamental, não apenas no transporte aéreo, descalabro nas rodovias enxovalhadas, atrapalhadas, ultrapassadas. Descalabro no transporte ferroviário, inexistente, ineficiente, obsoleto. descalabro nas escolas públicas, na saúde, nos hospitais. Descalabro nas contas dos governos licenciosos e corruptos.

Descalabro, não só governamental, mas descalabro institucional _ Eis a questão!



Capítulo  II

26 de dezembro de 2006



Nem bem termina uma crise, já lá vem outra!

                Mais uma vez as autoridades dizem que agora sim, já fizeram o papel que lhes cabia, cumprindo tudo o que foi pedido, tudo lhes foi dado. Todas as medidas foram pouco a pouco implantadas. A situação entre os controladores de vôo, se normalizou, afirma o governo.

Mas, novamente as filas tornam a dar voltas. Cinco, seis horas na fila do check-in, em meio a corpos exaustos dormindo sobre suas bagagens, novamente as brigas, raivosas ameaças, dedos em riste, rostos crispados. Todos têm razão e ninguém tem razão.

Sabotagem, dizem as autoridades. Alguém danificou a placa do computador que controla os vôos. Assim, novamente o desespero toma conta de todos os cantos do aeroporto. Um sargento, aos prantos, confessa publicamente que, por desconhecimento, colocou uma placa com a polaridade invertida no controlador, reinstalando o caos. Se antes o motivo fora uma operação-padrão, ou greve tartaruga, realizada pelos controladores de voo, sob a ameaça de serem responsabilizados pela colisão de duas aeronaves, agora foi o despreparo de um militar, deslocado às pressas para assumir uma função, sem o devido treinamento.

Sanada a causa do problema, tudo bem agora?

Que nada, novamente o caos, as filas, as longas e intermináveis esperas, os atrasos e suspensões de vôos. O que foi agora? O mau tempo em São Paulo causou a paralisação de vôos, o tempo fechado no sul impediu os aviões de decolarem e outros de aterrissarem. Mas o sol voltou a brilhar e a crise continua... Pane nos aviões da TAM, paralisação de seis unidades para manutenção preventiva. O que aconteceu? Milhares de passageiros com bilhetes na mão, com lugares marcados, não conseguem embarcar. A crise agora está no sistema de reservas e emissão de bilhetes da companhia, o overbooking, uma prática usada por companhias aéreas e agências de viagem, que a TAM é useira e vezeira em adotar – significa a venda de mais bilhetes do que a capacidade dos aviões, um número muito acima do razoável, daquele que compensaria o NO SHOW, isto é, o não comparecimento na hora do embarque. 10%? Nada, isso poderia ser considerado normal, de fácil controle. Mas o overbooking chega a mais de 100% por aeronave. Como pode? Que descalabro é esse, meu Deus?

Que o governo seja ineficiente - já se sabe, infelizmente é o esperado! Que o tempo não colabore - é obra do destino, mas que a causa esteja na incompetência de uma empresa privada, cujo fim é o transporte de passageiros, que precisa gerenciar corretamente a venda de bilhetes, é surreal, inacreditável mesmo! A causa deste status quo é sem dúvida o paternalismo governamental, um vício cultivado há anos, dede os tempos da PANAIR, quando o governo se habituou a socorrer seguidamente empresas deficitárias na aviação particular. Desta vez não foi diferente, foram cinco os aviões da FAB deslocados para levar mais de três mil passageiros da TAM a seus destinos, para aliviar a pressão. Mesmo assim, nem esse esforço foi suficiente, as filas continuaram, os atrasos persistiram e, para culminar, surge um novo e gravíssimo problema: o extravio de bagagens, muitas, bem mais de mil. Os aviões da FAB não podiam se responsabilizar por elas, por isso não as transportaram. Foi assim: o passageiro embarca e a mala fica ou a bagagem vai e o passageiro não. Alegaram que as aeronaves militares não suportariam o excesso de peso, são pequenas e só com os passageiros já atingiam o limite. Como brasileiro é uma raça à parte, gente muito descontraída e desprevenida, confiantes no acaso, muitos viajam com bagagem sem identificação e veio daí o novo caos, passageiros a ligar, desesperados atrás de seus pertences. Nada se resolve e a crise continua. Culpam-se os controladores pela greve, o mau tempo pela falta de teto, a empresa aérea pelo overbooking e de quem é mesmo a culpa?  O francês diria, num caso de crime insolúvel, cherchez la femme, pois eles colocam sempre, a causa última de tudo, na mulher! Aqui, foi mesmo a inércia do governo, sua falta de visão, o despreparo do partido governamental que coloca gente despreparada na chefia de pastas importantíssimas e propositadamente resolveram deixar interesses escusos prevalecerem. E assim, deixaram a VARIG quebrar. Uma empresa com 89 anos de existência, reconhecida mundialmente pela qualidade dos serviços prestados. E com isso, perderam os brasileiros e, por mais incrível que pareça, perdeu também o Brasil que, como sócio, já havia investido muito capital na companhia.

Deixaram a VARIG quebrar e vem daí mais crise. Filas, intermináveis esperas, passageiros a implorar favor de outras companhias para que aceitassem o endosso do bilhete.

Qual seria a solução?

A meu ver, o governo deveria ter encampado a VARIG, nomeado um interventor para sanear a empresa, ter injetado recursos e se tornado seu maior credor. Mais tarde, resolvido o impasse e com a companhia fortalecida, promoveria então a licitação para a venda da empresa sadia, limpa e pujante, saindo ele mesmo, fortalecido pela opinião pública e com seu caixa reforçado. E tudo isso teria sido evitado. 

Governo incompetente, repleto de lobistas e aproveitadores, completamente irresponsável e inconfiável, precisou que a colisão, o desastre com vítimas trouxesse a tona essa verdade.

Falta de investimentos? Contingenciamento de recursos para a infraestrutura aeroportuária?

MENTIRA! Vejam a fortuna que foi gasta na construção e reforma da maior parte dos aeroportos do país. No Recife, por exemplo, foram abandonadas as antigas e obsoletas instalações para ser construído um novo prédio, moderno, com todos os requisitos de um aeroporto de primeiro mundo. Porque se investiu tanto dinheiro, implicando inclusive na construção de novos acessos com viadutos e linhas viárias e nada ou quase nada foi investido na modernização dos sistemas de controle de vôo, em recursos humanos, em qualificação profissional e formação de operadores e controladores?

Não. Investimento em pessoal e em melhoria técnica não traz retorno, não aparece! 

Pelo contrário, os recursos foram contingenciados quando se tratava de investimento no que não dava margem à retorno para os cofres do partido ou para o bolso dos ordenadores de despesas. Quando se trata de obra pública, quando as somas empenhadas são astronômicas, quando se tem a conivência de uma empreiteira para receber e depois pagar o “toco”, então a verba é fácil e abundante. Uma vergonha!

Resultado: um sistema de controle de vôo fragilizado, saturado, que não tem a menor condição de suportar o aumento do tráfego aéreo, vulnerável ao mais simples engano. Temos ainda hoje o mesmo sistema de gestão dos primórdios da aviação civil do Brasil, com operadores e gestores militares. O governo não parou para estudar a melhor forma de gestão, se deve permanecer militar, se deve ser civil, se deve ser terceirizado, operado por empresas privadas, escolhidas através de licitação pública, ou mesmo por empresas de capital misto. Ninguém sabe ainda qual o modelo a adotar. A aeronáutica não quer abrir mão da gestão, se apóia na premissa de que militar não faz greve, que obedece ao mais sagrado dos princípios militares: a hierarquia.

Há de todos os modelos nos demais países do mundo. Na Alemanha o sistema é terceirizado. Nos Estados Unidos a administração dos portos e aeroportos é gerenciado pela engenharia militar. Aqui, ninguém se entende. A área, por ser considerada militar, é subordinada ao Ministério da Defesa, cujo Ministro é sempre o último a saber das coisas. Em suas declarações, não diz coisa com coisa, mostra uma total desinformação. Dá aos sargentos o tratamento de operários sindicalizados o que fere frontalmente o princípio da hierarquia militar. O resultado é esta sucessão de crises que presenciamos. E, quem sofre é o povo, a classe média mal tratada, empobrecida. Resolveram agora que o sistema, que é centralizado em Brasília e controla 70% dos vôos do país, precisa ser descentralizado e levado para outras capitais e, não apenas isso, mas também deve ser multiplicado, por razões de segurança. É o chamado SINDATA. Caso o sistema de Brasília entre em colapso, por exemplo, imediatamente o de São Paulo assume, ou o de outra capital. Tal alteração demandará alguns anos para sua implantação. Mas, falar é fácil, o difícil é fazer. Enquanto isto, homens e mulheres, jovens e velhos, mães com bebês ao colo, estudantes, crianças, turistas, empresários, homens de negócio, padecem todos nas filas, nos saguões, nas salas de espera dos aeroportos de todo o Brasil.                   



Capítulo III

27 de dezembro de 2006

Os jornais de maiores circulações deram  o furo: nenhum dos aviões da TAM foi colocado em manutenção preventiva. O que aconteceu foi que ela desviou seis das aeronaves de sua frota para um frete milionário. Isso explica tudo! Realmente aquela desculpa de manutenção preventiva de tantas aeronaves era difícil de  engolir. Manutenção preventiva é desejável, necessária mesmo, mas nunca em período de tanta demanda, quando 100% da frota precisa necessariamente estar em funcionamento. Uma desculpa completamente sem cabimento, daquelas de quem acha que qualquer desculpa serve para um público tão pacato ! Ledo engano!

A TAM usou e abusou do overbooking, vendendo até mais de 100% do número de acentos disponíveis, tudo isso em nome do NO SHOW, isto é, passageiros que não comparecem ao check-in e não recebem nenhuma punição por isto. Em qualquer lugar do mundo esta prática seria crime de estelionato, pois quem vende o que não tem está praticando estelionato. Só quem já passou por isso pode saber o constrangimento de chegar no balcão para o check-in, bilhetes na mão, dentro do horário, ou seja, uma hora antes e receber a notícia de que o voo está lotado e você sobrou. Foi o que se deu conosco, no aeroporto de Recife, voltando de Petrolina, às 15 horas, e com um compromisso inadiável em Natal, marcado para às dezoito horas daquele mesmo dia. Estava tudo certo, pegaríamos uma conexão. Precisaríamos estar em Natal para a festa de transmissão do cargo de Governador do Distrito 4.500 de RI para meu sucessor. Toda a cerimônia havia sido programada com muita antecedência, pois receberíamos a visita de inúmeros rotarianos de diversas cidades dos três estados: Pernambuco, Paraíba  e Rio Grande do Norte. E pior: não haveria nenhum outro vôo, mesmo em outras companhias que fizesse o percurso ao nosso destino neste intervalo de tempo.

Impasses como esse aconteceram um cem número de vezes sem que houvesse sansão governamental, alguma punição.

Como chegamos a uma situação como essa?

Hoje somos reféns de políticos inescrupulosos, que vêm enganando um povo sem cultura, sem educação, habituado a receber esmolas para se sustentar pois, propositadamente, nossos governos não têm a menor vontade de instruí-lo ou educá-lo para não perder o poder sobre essa população facilmente manipulável.

 

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5 comentários:

PATRÍCIA OLIVEIRA disse...

Olá, muito boa a reportagem do aeroporto. Não aguentamos mas tanto descaso.

Suzete Serodio disse...

Essa reportagem é a realidade do caos que se instala há anos nesse país. A vítima maoir, como sempre, é o povo que paga os seus impostos.
Parabens pelo texto tão bem escrito
Suzete Seródio

PAULO ROBERTO MAGALHÃES disse...

De uma maneira sucinta e bem desenvolvida vc conseguiu retratar a incompetência e a safadeza reinante no país. Ainda assim os nossos governantes, se é que podem ser chamados assim, ainda tem a pretensão de implantar o projeto do Trem-Bala. É de chorar de rir.
Parabens pelo seu texto que poderia perfeitamente ser matéria dos melhores jornais, tanto que estou repassando para os amigos.
Abraços,
Paulo Roberto Magalhães.

dandomaispalpites disse...

E tudo continua do mesmo jeito... a viagem de 45 minutos pode se transformar em uma saga de metade de um dia. Excelente reportagem!

ADALBERTO ARRUDA disse...

Prezado mestre ALBERTO: Parabéns. Li tudo de um fôlego e encantado.
Permita-me a ousadia de um breve comentário sobre as greves nos
aeroportos pela PolÍcia Federal. Fico a pensar que além da covardia e insensibilidade humana, vai às raias de verdadeiro crime de tortura e ferino de direitos humanos. Indefesa e temerosa de reação violenta de algum dos policiais (beleguins) armados que cometem aqueles abusos,a população sofre verdadeiro assédio moral, ou mesmo espécie de tortura que bem poderia ser apreciado pelo Ministério Público e Poder
Judiciário. Tenho pensado nisso. A greve dos professores
universitários também parece-me abuso intolerável. Lembro-me de um
ainda recente livro escrito por professor de USP, com o título "Ócio e Vagabundagem na Universidade". Já são categoria de trabalhadores privilegiados. Parabéns. ADALBERTO ARRUDA