O CRACK
Uma história real
Alberto Bittencourt
Fausto, Fabiano e Fabrício, 11, 9 e 7 anos de
idade. Vivem na favela dos Coelhos, onde têm uma importante tarefa a cumprir.
Saem de casa todos os dias, pela manhã, com a missão de trazer dinheiro no fim
da tarde. Moram com o pai, a mãe e a avó.
O dinheiro vai alimentar, não só a família, mas
também o vício dos pais que se tornam enlouquecidos quando falta crack. Os dois
menores fingem tomar conta dos carros estacionados nas ruas. Fausto, o mais
velho, vive entre o ponto de venda de tóxicos e os drogados, a quem vende pedras, cocaina e maconha. É esse moleque de apenas 11 anos, quem financia o vício dos pais.
Nenhum dos três frequenta a escola. Não sabem ler
nem escrever e assim, não têm nenhuma chance de sair dessa vida miserável.
Fausto tem apenas um sonho, o de se tornar, um dia, o chefe do tráfico. É este
o seu objetivo de vida. A avó, com os cabelos todos brancos, também não sabe
ler nem escrever. Viu a filha se tornar mãe aos doze anos, assim como ela. Ambas
são precocemente envelhecidas. Essa avó mostra no semblante desfigurado o que a vida
já lhe trouxe - a morte de dois filhos na guerra do tráfico. Deseja agora salvar
os netos, para que eles não tenham o mesmo fim. O pouco dinheiro, entretanto,
transforma a vida num inferno. Como se tudo isso não bastasse, há ainda o
suplício de ver a família caminhar para a destruição causada pelo crack. E, o
que é pior, ver o pai e a mãe empurrarem as crianças para as drogas.
A comunidade assiste impotente à degradação da
família. Vê a mãe levar os filhos menores para mendigar nas ruas o dinheiro do
crack. As três crianças não têm a menor chance de sair dessa situação. Elas precisam
de ajuda, de uma mão libertadora.
Quando tudo parecia perdido, algumas pessoas de bem decidiram mudar o futuro daqueles
meninos, ajudando-os a deixar essa vida, que não leva a lugar nenhum. É uma
corrida contra o relógio, bem o sabem. Das autoridades, nada esperam! É
preciso fazer alguma coisa. Agora ou nunca!
O único meio de salvar os meninos seria afastá-los
dos pais drogados e viciados. Então tomaram a única decisão possível. Expulsaram
na base da porrada o casal da favela. No mês seguinte apareceu,
num terreno à margem do rio Capibaribe, um corpo de mulher. Abraçada a uma boneca de pano, trazia seis perfurações a bala. Reconhecida pela avó, pagara o preço do acerto de contas com o tráfico.
Uma instituição cuida de Fausto, o mais velho. Ele
já está numa idade mais delicada, precisa de mais cuidados, de pessoal
competente, habilitado para tratá-lo, psicólogo, médico, pedagogo, para disponibilizá-lo à adoção, reconduzi-lo
de volta à vida, ao lado de pessoas que o respeitem e que o amem.
A avó tomou a si o encargo de cuidar dos dois
menores. A comunidade os protege, pois todos sabem da violência do tráfico e de
sua crueldade. Essa verdade é para todos, mata-se mais jovens hoje, vítimas do
tráfico, que em muitas guerras do mundo.
A avó mudou de rotina. Acorda cedo, prepara o café,
quando tem e, diariamente, leva as duas crianças para a escola. Ali ela sabe
que eles receberão as refeições bem balanceadas e preceitos de saúde e higiene,
além de conceitos éticos e ensinamentos básicos para a nova vida que se abre
agora para eles também.
É uma luta de gato e rato. O tráfico continua
seduzindo crianças e adolescentes. Enquanto uns sucumbem, outros conseguem subsistir,
ou subexistir. Ninguém espera nada das autoridades, nem dos
politiqueiros, que só aparecem nas campanhas, nas eleições.
Essa avó está decidida a não perder os dois netos,
mas ela sabe que não tem muito tempo à sua frente. A vida lhe é escassa, falta-lhe
energia e disposição. Essa mulher idosa, bastante desgastada, reúne as últimas
forças e, animada por um sonho, ainda luta pelos netos, pensando
em torná-las homens de bem, trabalhadores honestos, mesmo que pobres, mas longe
das drogas. Sente o apoio da comunidade, que a ajuda e dá força, para que estes
dois meninos não façam parte das frias estatísticas dessa guerra insana e cruel.
5 comentários:
Uma das guerras mais cruéis e violentas desse mundo moderno. O texto está muito bom!
Alberto, sempre amigo:
No texto benfeito, a revelação de uma desesperança.
Desesperança dos que sofrem com isso, desesperança minha no futuro (e no passado e no presente) de uma humanidade tão iníqua a que pertenço, descrente eu hoje de tudo.
Poupo-me (contrafeito) de comentar agora toda essa miséria.
Louvo os que se preocupam com ela.
Ainda falaremos sobre isso.
Seu amigo
Portela
Meu estimado governador Alberto Bittencourt,
Continuo apreciando os seus belos e oportunos trabalhos.
Na minha modesta opinião pessoal, baseada em um sério trababalho de um economista americano que foi contemplado com o prêmio Nobel de Economia, há mais ou menos cinco anos, só há uma solução para o problema das drogas: a liberalização de todas as drogas.
Neste caso, o governo teria o controle da qualidade das drogas vendidas, teria um melhor conhecimento dos consumidores para ajudá-los com tratamento médico, o governo arrecadaria impostos sobre a venda das drogas para as despesas necessárias ao tratamento e orientações aos dependentes e o tráfico de drogas ficaria desinteressante.
Só há traficantes porque existe a demanda de consumidores. Combater o traficante jamais resolverá o problema.É burrice.
Acontece, meu Governador, que o sistema financeiro internacional "lava" cerca de US$ 500bi a 700bi de dinheiro sujo proveniente das drogas, a/a. Acho esses cálculos um pouco exagerados, porém, é certo que a "lavanderia" existe e é mantida por capitalistas poderosos e governos corruptos.
Parte deste imenso volume de dinheiro ajuda a eleger "democraticamente" políticos "honrados" em várias partes do mundo.
Há anos, o Comandante da Polícia Militar do Estado de São Paulo afirmou em uma palestra, o seguinte: "toda a sociedade gosta quando mandam a minha polícia invadir as favelas à procura de traficantes. Acontece que os verdadeiros traficantes encontram-se em seus palacetes nos bairros nobres da cidade. E lá, não somos autorizados a entrar".
Todos nós sabemos desta verdade; o resto é hipocrisia.
Agradeço-lhe sinceramente pelos artigos.
Abraços
Geraldo
Caro Companheiro Alberto.
É devastador essa droga que aniquila o bem mais precioso da sociedade.a família.
Acho que o momento é oportuno para que o Rotary em uma ação conjunta envolvendo todos os clubes do Distrito 4500, através de um projeto de inclusão e qualificação profissional de crianças e adolescentes que vivem perambulando pelas rua da cidade ,vítima de abandono,maus tratos e negligência, onde cada clube ficaria encarregado pela população do seu entorno sobe uma coordenação geral da Governadoria. Afinal é um dever de todos,imclusive a sociedade, fazer valer o estaturo da criança e do adolescente em seu artigo 227:
“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Meu Caro Alberto Bittencourt,
Sobre seu E-mail " O CRACK ".
É uma triste realidade, a qual o Rotary é pequeno para isoladamente tentar uma solução. Trata-se de fato de um e grande Problema de Estado.
Obrigado.
Um Grande Abraço
Háteras
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