ALBERTO BITTENCOURT - Palestrante, motivador, consultor, escritor, biógrafo pessoal

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sábado, 26 de dezembro de 2020

CEIA DE NATAL SE e


CEIA DE NATAL 
Alberto Bittencourt - 23 dez 2012





Faltando apenas alguns dias para o Natal, o ônibus se deslocava lentamente por uma congestionada avenida Caxangá, direção subúrbio-cidade. O céu parecia tingido de azul turquesa, com salpicos de algodão. Uma brisa constante, vinda do mar, mantinha a temperatura amena e agradável. A esplendorosa manhã, teimando em continuar primaveril, contrastava com a atmosfera pesada e quente, dentro do veículo lotado e barulhento.
Sentada na primeira fila, uma mulher de semblante amargurado, parecia alheia ao ambiente. Clara pensava no Natal e na filha Cristina, de seis anos, que ficara em casa, aos cuidados da avó. Estava ao mesmo tempo triste e resignada, pois não tinha como atender ao pedido da menina. Ela não lhe pedira bonecas, nem brinquedos, nem roupa nova, nem sapatos. A criança perdera o encanto pelos presentes desde que soubera na escola que Papai Noel não existe. Para surpresa da mãe, o pedido de Tina se resumiu à Ceia de Natal. Dessas que já vira nas novelas. A mesa posta com toalha de motivos natalinos, ornada de flores e velas, os pratos, copos e talheres, cuidadosamente arrumados, sucos, refrigerantes variados, iguarias de dar água na boca, tudo preparado com amor, para ser partilhado numa ocasião muito especial. 
A imagem da família reunida em torno da mesa, cada um na sua melhor fatiota, se afigurava utópica para Clara, impossível sem dinheiro. Ela tentara explicar à filha o significado da reunião, a celebração do nascimento do irmão maior, Jesus Cristo. Disse, que apesar de serem apenas três pessoas na casa, avó, filha e neta, - o pai desapareceu tão logo ela se confessou grávida, - as três formavam, sim, uma família, unidas no amor e nas adversidades.
A casa pobre, espremida numa ruela de Camaragibe, tinha sala-cozinha e um só quarto, com uma cama e um estrado, onde dormiam as três. A mãe, hoje aposentada, conseguira comprá-la após uma vida inteira de trabalho como empregada doméstica. Clara, costumava arrumar serviço de cuidadora de idosos. No momento, estava desempregada e sem dinheiro. A aposentadoria da mãe mal cobria as necessidades.
No percurso do ônibus, Clara ia envolta em pensamentos negativos. Ela marcara uma entrevista de emprego e pedia a Deus que tudo desse certo. Queria atender o pedido deTina, nem que fosse para um arremedo de ceia, para rezarem e comerem qualquer coisa. Mas, como fazer, sem dinheiro?
Clara nem notou que o ônibus estava cada vez mais lotado. Os passageiros se acotovelavam no corredor entre as fileiras de poltronas.
Clara já telefonara para alguns amigos com os quais costumava de quando em vez fazer programa, em troca de pequena ajuda financeira. Nenhum deles a atendera. Ela, apesar de jovem e bonita, não tinha namorado. Altura média, corpo esguio, olhos verdes, vivos e inteligentes, cabelos longos e louros, a pele macia, de cor clara como seu nome. Em respeito à filha e à mãe, sempre ficara longe das drogas. Dizia que boyzinho não dá futuro, bastava a experiência com o pai de Tina e por isso, procurava a companhia de homens mais maduros, sem se preocupar com o estado civil. No momento, todos estavam fora, ou tinham outros compromissos. Ela não era mulher de fazer pegação nas esquinas, nem de frequentar boates e lupanares. Não se considerava prostituta, mas agora estava em dificuldades. O que fazer? Fechou os olhos. Pediu a Deus que a ajudasse. Não queria deixar passar em branco o pedido da filha, da Ceia de Natal, mesmo que na tosca mesa de sua casinha.
Num instante Clara sentiu um toque no ombro esquerdo. Alguém, do banco de trás a cutucou. Virou e deparou-se com um homem bem vestido, cabelos negros, compridos, arrumados em rabo de cavalo, brincos nas orelhas. Clara adivinhou logo as preferências sexuais do estranho, ele não poderia estar, portanto, interessado na sua pessoa.
Sem nada dizer, o homem passou-lhe um cartão. Estava escrito coiffeur. Clara não sabia o que era. Subitamente ele começou a falar: Que cabelos lindos, bem se vê que nunca foram tingidos. Que tonalidade, que maciez, que desenvoltura, sem nós, ou fios quebradiços, a cor clara, natural, perfeita.
Lisos e dourados, os cabelos eram a alegria de Clara, a sua maior esperança. Ela os cultivava como a um tesouro há 15 anos. Quando podia, comprava shampoos de marca, para tê-los sempre soltos, leves e brilhantes. Com eles, tivera momentos felizes, alegres, que fazem parte de sua história e de suas lembranças. Os cabelos eram a razão de ser de seus sonhos. Imaginava-se modelo fotográfico, capa de revista, a aparecer na TV, linda, entre anúncios de produtos miraculosos.
Clara desconversou e voltou aos seus pensamentos de amargura.
O homem insistiu. Tome o meu cartão, sou cabeleireiro, o salão fica no Shopping. Quer vender o seu cabelo? Eu pago R$ 500,00. Clara levou um susto, quase caiu do banco. De verdade? Sim, procure-me amanhã às 15 horas nesse local. Clara não pensou duas vezes, aceitou sem regatear.
No dia seguinte, à hora aprazada, lá estava ela, no salão. Esquecera todos os planos de modelo fotográfico, só pensava na filha e na Ceia de Natal. O coiffeur aplicou-lhe o tratamento adequado. Clara sentia-se a tal no ambiente sofisticado, ao lado das grã-finas. Primeiro, um banho com água morna, shampoo e massagem. A seguir, mãos hábeis e experimentadas, fizeram uma trança, que foi cortada e acondicionada cuidadosamente dentro de um saco plástico.
Clara recebeu o pagamento combinado e saiu feliz. O milagre acontecera. A filha ia ter a Ceia de Natal e ainda dava para comprar uns presentinhos. Pensou, num impulso: Ano que vem vou vender os cabelos da Tina... Mas logo sentiu o chamamento para a tarefa mais importante: agradecer a Deus pela graça recebida.



8 comentários:

Genesio Vivanco disse...

Compº Bittencourt. Passados o Natal e as festas de Ano Novo, voltei a leitura dos escritos pelos amigos e não me surpreendu o belo conto escrito por vc.. A alma cristã se eleva sempre que o imponderável acontece. O amor e a fé são atributos que fazem o caminhar seguro em prol da paz e da felicidade.
Parabens!

arlego disse...

Caro amigo. Quem tem a sensibilidade de escrever um conto dessa natureza, nem precisa nos desejar "Feliz Natal". Ele virá naturalmente com a própria narrativa. Abraços, Arlégo.

Prof. Artur Reis disse...

Caro companheiro Alberto, gostei muito deste seu conto de Natal, pois consegue reunir a simplicidade, a emoção e a beleza de uma estória que nos prende até o final com motivo natalino. Parabéns! Espero que seus contos possam se transformar num livro. Forte abraço e Feliz Natal.

HÁTERAS disse...

Meu Caro Alberto,
Lendo seu LINDO, Conto de Natal, desejamos a você e
família , em retribuição ,seus Votos de Feliz Natal e Próspero Ano Novo.
Abraços
Háteras e família

Alfredo Nunes disse...

Prezado companheiro estamos deste modo enviando nossos votos de um Feliz Natal e que o Ano Novo seja próspero e realizador e que nossos sonhos se aproximem da realidade, são os votos que desejamos para você e h
Helena. Um abraço e tudo de bom.
PS continue escrevendo

VICENTE HERCULANO disse...

Caro companheio confrade da nossa nova mas já imortal ABROL...
UM FELIZ NATAL E UM ANO NOVO CHEIO DE PLENAS REALIZAÇÕES não só para voce, mas, tambem sua família e para todos nós....
cumprimento-o, como já faço várias vezes, pelo seu conto CEIA DE NATAL....
reflete de uma forma clara, transparente, toda esta magia que é o NATAL e capta com uma singularidade machadiana,as tragédias não só amorosas, passionais dentro do clímax da infidelidade, como também, as esperanças espelhadas na face daquela mulher que você tão bem descreve, acreditando na solidariedade humana, como uma verdadeira blindagem aos sonhos das pessoas carentes de que existe o espírito do NATAL....
PARABENS....
VICENTE HERCULANO DA SILVA

GEORGE A. ALVES disse...

Companheiro Alberto Bittencourt...

Parabens pelo maravilhoso conto, o qual demonstra que DEUS 'escreve certo por linhas tortas', e que sua extrema piedade permite a realização de milagres, nesse caso, talvez, não para a mãe Clara, simplesmente, mas, também, e principalmente, para a inocente filha que, já decepcionada pela revelação de inexistência de Papai Noel, não merecia ser frustrada pela ausência da Ceia Natalina.

Que DEUS nosso Criador lhes conceda, a você e todos os seus, um Novo Ano (2013) de muita Saúde e Paz.

do companheiro (Largo da Paz),

George A. Alves.

JS TECNOLOGIA & COACHING disse...

Contagiante, inspirador !