ALBERTO BITTENCOURT - Palestrante, motivador, consultor, escritor, biógrafo pessoal

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ALBERTO BITTENCOURT - Palestrante, conferencista, motivador, consultor, escritor, biógrafo pessoal

quinta-feira, 12 de novembro de 2020

HÁ QUARENTA ANOS

 

HÁ QUARENTA ANOS

Alberto Bittencourt – março, 2004

 

         Agora só se fala em golpe militar de 1964. De repente todo mundo começou a jogar a culpa de todas as mazelas e atribulações em cima do movimento que culminou com a deposição do Presidente da República, João Goulart.

         Quem, como eu, viveu intensamente aqueles dias, sabe como foi. Há quarenta anos, na flor dos 21 anos, eu, tenente recém egresso da Academia Militar das Agulhas Negras, AMAN, servia em plena Vila Militar do Rio de Janeiro, palco dos acontecimentos mais marcantes. Ali, antes de 31 de março, passamos semanas e mais semanas de prontidão, preparados para intervir a qualquer momento nas agitações que assolavam a cidade. Dali partimos muitas vezes, os tenentes, com seus pelotões de choque, em operações chamadas de “controle de tumulto”, para evitar os quebra-quebras nas estações de trem e em outros pontos vitais. Que eu saiba, nunca foi preciso disparar um só tiro.

         A classe média, as classes produtoras, a maioria da população que vivia a insegurança daqueles dias, passou a desenvolver um medo, um quase terror, quando as propaladas “reformas de base” lhes ameaçaram o direito de propriedade, os direitos adquiridos, as conquistas de suas muitas lutas.

         Quando o líder comunista, Luiz Carlos Prestes, afirmou: “temos o poder, falta-nos apenas o governo”, o descontrole total já persistia. Os sindicatos se haviam lançado na transformação do país em república sindicalista, os soldados, os marinheiros, se rebelavam dentro dos quartéis. Assisti estarrecido, no início da carreira, à subversão daquilo que me ensinaram ser o mais sagrado dos princípios: o da hierarquia militar. Vi um almirante que se dizia popular ser carregado nos ombros por fuzileiros navais indisciplinados. Assisti discursos inflamados dos sargentos da Aeronáutica. Vi a demagogia interesseira campear nos comícios da Central do Brasil.

         A tudo presenciei, em noites de prontidão, adivinhando aonde queriam levar o Brasil. 

Naquele mês de março, a inflação chegou a mais de 80% ao mês, numa época em que ainda não existia correção monetária, nem indexação. Então vi a classe média explodir numa passeata de mais de 500 mil pessoas, chamada de “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”. Vi panelaços das donas de casa em protestos contra o custo de vida.

         Foram dias de tensão, quando as tropas irmãs se defrontaram em Barra Mansa, Estado do Rio. De um lado, entrincheiradas, estavam as forças do Rio, em defesa do que chamavam de legalidade. Do outro, avançando, as tropas de Minas, sob o commando do general Olímpio Mourão Filho, incentivadas pelo governador Magalhães Pinto e de São Paulo, comandadas pelo general Kruel, com o incentivo do governador Ademar de Barros. A separar, apenas o rio Barra Mansa.

         Somente o espírito pacífico, conciliador, tradicional inimigo de guerras fraticidas do brasileiro evitou, por um triz, o derramamento de sangue irmão. Castelo Branco assumiu o comando e determinou que todos voltassem para seus quartéis. A ordem soou como uma benção. Ninguém queria lutar, ninguém queria o confronto, a guerra. Foi um alívio geral. Pode-se dizer que praticamente não houve derramamento de sangue.

         Semanas depois, ao retornar para casa, após dias e mais dias em campanha, nos quartéis e nas ruas, fui recebido com honras de herói pela família, parentes, vizinhos. Todos me deram os parabéns, por haver participado do processo que defenestrou os agitadores, os corruptos, os que queriam implantar o regime comunista, tabu monstruoso que se constituíra na grande ameaça.

         Minha mãe afirmou: - “Que grande experiência, meu filho!” E foi mesmo. A partir daí, passamos a torcer pelos rumos do que se chamou no meio militar de “revolução democrática de 31 de março de 1964”.

         Revolução, contra-revolução, golpe, que importa o nome? Na realidade, tudo foi conseqüência de um processo revolucionário que vinha amadurecendo no seio da maioria dos brasileiros. Na realidade tudo aconteceu como resposta a um anseio que emergiu da classe média.

         Acompanhamos, a partir daí, erros e acertos da revolução. O Brasil progrediu. A inflação foi drasticamente controlada logo no primeiro ano. Instituições foram criadas que mudaram a vida dos brasileiros. O país avançou tecnologicamente. Criaram-se indústrias, fortaleceram-se empresas. Infelizmente houve disputa de poder, houve torturas, vieram os anos de chumbo. Por não entenderem de macro-economia os militares entregaram a condução da política econômica a técnicos e especialistas civis. E o resultado, que no começo foi bom, deu no que deu. Em quarenta anos, de 1942 a 1982, o crescimento médio do PIB foi de 8% ao ano. De 1982 a 2002, a média foi de apenas 2% ao ano. Duas décadas perdidas. Conseqüência de 1964?  Ou quem sabe, de uma nova ordem econômica mundial, da globalização? Ninguém sabe. Mas, chega de botar a culpa nos outros, chega de transferir responsabilidades. É culpa sim, da nossa incompetência. Um dia o Brasil ressurgirá num Novo Mundo, onde todos serão irmãos, não haverá mais guerras, nem violência urbana, nem fome, nem miséria. É apenas um sonho. Só nos resta sonhar e trabalhar.

 

 

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