ALBERTO BITTENCOURT - Palestrante, motivador, consultor, escritor, biógrafo pessoal

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ALBERTO BITTENCOURT - Palestrante, conferencista, motivador, consultor, escritor, biógrafo pessoal

quarta-feira, 22 de maio de 2019

HABITAÇÃO


Michel Quoist - escritor francês, 1921-1997


Transcrevo abaixo, o poema Moradia, de Michel Quoist, extraído do livro Poemas para Rezar, escrito em 1954, com textos dos jornais da época:

Moradia
                                                                                                                 Michel Quoist - 1954

Sei que naquele único quarto, mistura-se hálito emprestado de  treze pessoas amontoadas.
Sei que u’a mãe pendura ao teto a mesa e as cadeiras para estender as enxergas no chão.
Sei que os ratos acorrem para roer as cascas de pão velho e morder os bebês.
Sei que o homem se levanta para abrir o encerado por cima da cama encharcada de seus quatro filhos.
Sei que a mãe fica em pé a noite inteira porque só há lugar para uma cama e as duas crianças estão doentes.
Sei que um bêbado vomita sobre a criança que dorme ao seu lado.
Sei que o rapaz foge sozinho dentro da noite porque não agüenta mais.
Sei que os homens brigam por causa das mulheres, pois são três casais no mesmo sótão.
Sei que o irmão gera um filho com a irmã, ele tem vinte anos, ela dezesseis e dormem os dois, corpo a corpo no mesmo colchão.
Sei que a esposa rejeita o esposo pois não há mais lugar para outro filho.
Sei que um menino agoniza, mansamente, preparando-se para se reunir lá no céu a seus quatro irmãozinhos.
Sei,
Sei mais ainda,
Sei centenas de outros fatos, enquanto em paz eu ia dormir entre meus lençóis branquinhos.   




HABITAÇÃO
Um dos grandes problemas brasileiros

Alberto Bittencourt - outubro de  2005

O problema da habitação é trágico em todas as cidades do mundo. O Brasil nos últimos quarenta anos aumentou sua população em mais de 100 milhões de habitantes. Em 1964 éramos 80 milhões, hoje, 2005, somos mais de 185 milhões. 
Em 1964, antes da revolução, havia um movimento pela reforma agrária, era o SUPRA do governo Jango – Superintendência da Reforma Agrária. Por ser considerado um valhacouto de políticos corruptos e subversivos, o movimento foi abortado pelos governos militares. 
Criaram o INCRA - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, apenas uma autarquia, empregando muitos coronéis da reserva. Perguntei a um deles o que ele fazia ali e ele me respondeu: Estamos cadastrando as terras
E ficaram anos e anos apenas cadastrando as terras, até que surgiu, com a redemocratização, o MST, com as invasões de terras produtivas e improdutivas. O movimento pegou todo mundo de surpresa, ninguém imaginava que houvesse tantos sem-terras no interior, sim, porque nesses quarenta ou cinqüenta anos, a urbanização do país foi de tal ordem, de tal intensidade, que mais de 80% da população rural migrou para as cidades, tornou-se urbana.
Com o apoio da turma de direitos humanos, de políticos, de ONGs, de sindicatos, o MST se organizou. Constituiu-se num poder paralelo, à margem da Lei e da Ordem, não respeita a constituição e sequer considera o mais sagrado de todos os direitos do regime capitalista: o da propriedade privada. O MST age ao arrepio da Lei. Arregimenta para suas fileiras bandos de desempregados e marginais na periferia das cidades. Ao invadirem uma propriedade, nada respeitam. Destroem, botam fogo, quebram o que vêem pela frente, não sobram nem as máquinas e equipamentos agrícolas. Matam animais da fazenda para se banquetearem. De tempos em tempos, vemos nos jornais barbaridades praticadas por estes vândalos. Será o império da desordem, da anarquia, ou será a tão necessária e decantada distribuição de renda?  Ou talvez os dois.

As megalópoles brasileiras incharam, se multiplicaram. A palavra favela, um termo genuinamente brasileiro, foi exportado para o mundo inteiro, Paris, New York, Moscou. Consta nos dicionários franceses. Virou um termo de conotação pejorativa no Brasil, denigre as pessoas que nela habitam. É politicamente mais correto chamá-las de "Comunidades". É o que dizem os assistentes sociais, antropólogos e sociólogos.
A Comunidade da Rocinha, no Rio de Janeiro, tem mais de 150 mil habitantes. Quem vai de São Conrado para o Leblon, antes de entrar no túnel Dois Irmãos, ao olhar para cima, vê a encosta do morro totalmente encoberta por milhares de moradias. Empilhadas na encosta, separadas por vielas estreitas e escadas, são, em sua em sua totalidade, erguidas em alvenaria, algumas até com reboco. Muitas têm mais de um pavimento, vemos até prédios de cinco andares por lá. Será que tudo isto pode ser chamado de favela? Não mais. É uma comunidade onde se amontoam 150 mil pessoas, provida de luz elétrica, mas sem coleta de lixo e nem recolhimento de esgoto. No carnaval, esse povo se organiza e consegue fazer um dos mais belos e ricos desfiles de escolas de samba. Não fosse a chuva que desabou em cima, bem na hora em que a escola passou e alguns problemas com carros alegóricos, extremamente complexos, que emperraram, certamente teria obtido uma das primeiras colocações. 
Esse mesmo povo convive, quase que diariamente, com o crime organizado, as guerras entre quadrilhas, as disputas por território, que deixam vítimas inocentes, sem escolher idade e uma população assustada que se submete ao poder paralelo do traficante. Terra de ninguém, onde a polícia não entra, a lei é do mais forte. Manda quem pode, obedece quem tem juízo. Não pensem que este caos começou há pouco. Com a sucessão de políticos demagogos, que visam unicamente à eleição, a partir dos anos cinqüenta, iniciando com a era Getúlio Vargas e chegando até nossos dias, instala-se uma situação de desmando e pouco caso para com a lei, a ordem e, principalmente com o cidadão e eleitor. Cria-se um vazio de liderança nessas comunidades adensadas que propiciou a ocupação deste espaço pela força do tráfico que encontrou um ótimo abrigo, longe das autoridades e perto dos usuários.

Essas comunidades como a Rocinha, há muito já deixaram de ser favelas. Ali circula dinheiro, elevando a renda de parte dessa população, que passa, então, de pobres, a gente abastada ou remediada. Favelas são como algumas que conheço aqui no Recife: a do Bode, no bairro do Pina; Entra a Pulso, em Boa Viagem; a do Coque e a da Maré e tantas outras. As casas sobre palafitas, barracos de madeira, papelão, plástico, chão de terra, em meio ao esgoto a céu aberto e as pessoas se apertando dentro de um vão infecto e insalubre.
Só para sentirmos no peito que o tempo passa e nada muda, demonstrando assim que não há o menor interesse, por parte de nossos políticos ou governantes, pois esses eleitores que não vivem, apenas existem, como animais, são manobrados por eles que se aproveitam de suas ignorâncias. 

                                              x-x-x-x-x                                                                      

2 comentários:

Unknown disse...

Meu caro Governador Alberto,

É sempre bom ler os seus textos, fruto de uma inteligência rara, de observador fiel e um rotariano exemplar. Ainda guardamos em Montes Claros as boas lembranças da sua passagem pelo nosso Forum Distrital de Imagem Pública.

Meu cordial abraço
Alexandre Pires Ramos
Governador Distrito 4760 16/17

Anônimo disse...

DESALENTO
Dois livros de Michel Quoist foram livros de cabeceira em minha adolescência. Da Helena também:
1- Poemas para rezar
2- Construir o Homem e o Mundo.
Ainda os tenho em minha biblioteca.
Em 1954, éramos dois bilhões de habitantes no mundo. Hoje somos mais de sete bilhões. Quem mais cresceu foi justamente essa população pobre, desassistida, habitantes de cortiços e favelas. Com a pobreza extrema, multiplicou-se a fome, a violência, a falta moradia digna e de saúde, o analfabetismo funcional e o que é pior - o desalento daqueles que não estudam e nem trabalham.
OBRIGADO POR SEU COMENTÁRIO, QUERIDA PRIMA ANA.