ALBERTO BITTENCOURT - Palestrante, motivador, consultor, escritor, biógrafo pessoal

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ALBERTO BITTENCOURT - Palestrante, conferencista, motivador, consultor, escritor, biógrafo pessoal

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

MENINAS DO CRACK




MENINAS DO CRACK


Alberto Bittencourt


Patrícia tem vinte anos. Há dois está reclusa na Colônia Penal Feminina do Bom Pastor, onde aguarda julgamento por tráfico de entorpecentes. 

Aos quinze entrou para o submundo das drogas, através do relacionamento com Marcão, um manda chuva da favela. Conhecera-o, quando, iniciada como avião, aguardava sua vez de receber mercadoria em consignação. Descalça, usava short e sutiã sem blusa. Era só o que possuía. Pele morena, cabelos compridos e lisos, certo ar rebelde, de moleca desafiadora.

Filha única entre quatro irmãos, pai desconhecido, mãe viciada, prostituída, Patrícia cresceu a esmolar pelas ruas. Não frequentou regularmente a escola, mas conseguiu se alfabetizar com certa facilidade. 

O dinheiro da droga trouxe benefícios para sua casa. Já nem se lembrava dos tempos de penúria. Marcão lhe dava além da proteção, tudo o que ela precisava e queria: roupas, drogas, celular, dinheiro, som, até uma moderna TV de 42 polegadas.

A mãe sentia orgulho da filha ser mulher de bandido.

Patrícia era feliz. Mandou gravar uma tatuagem, no cangote, com o nome do amante, Marcos, dentro de um coração vermelho, cercado de anjos, expressão de seu amor eterno.

Após alguns meses de relacionamento, descobrira-se grávida. Logo soube que era menino. Depois veio a notícia trágica.

Em plena luz de um dia de movimento, Marcão deixara a boca e se dirigia para casa. Vieram os motoqueiros, tentou fugir, quatorze disparos encerraram uma carreira mal começada, aos 26 anos de idade.

Patrícia atirou-se sobre o corpo inerte. No desespero, o queria de volta, não podia ficar sem o amante e protetor. O que seria dela e do filho, ainda por nascer?

Ao enterro compareceram as meninas do crack, adolescentes como ela, encarregadas de buscar pedras para usuários. As idades podiam variar dos 13 aos 18. 

Confirmando o que fingia não saber, lá estavam mais duas meninas grávidas, se dizendo mulheres de Marcão e outras chorando a perda do namorado traficante.

A mãe de Marcão disse que cuidaria dos três bebês.

O meu eu não dou! Patrícia prosseguiu na tarefa de pegar pacotes de crack, levar para os consumidores, repor o dinheiro. O lucro mal dava para o mínimo, o leite, recebia do governo.

Graças a uma disciplina férrea, Patrícia não consumia drogas. Sabia que, se o fizesse, terminaria por voltar à mendicância, como acontecia com outras meninas do crack, de crianças à tiracolo. 

E agora? Seu irmão, viciado, roubara a feira do dia. Não tinha como repor. Desesperada, arrumou a trouxinha do bebê a quem batizara de Marcos – pelo menos assim aproveitaria a tatuagem, não ficaria inútil – e o levou para a casa da sogra. Adeus, meu bebê. Mainha vai viajar, minha vida!

Chorando, Patrícia entrou na delegacia. Seu delegado me prenda, pelo amor de Deus. Na minha bolsa tem pedra, sou traficante, o Sr pode conferir. Por favor, não me deixe voltar, eu tenho um filhinho de seis meses, eles vão me matar, vão matar meu bebê.

O delegado mandou lavrar o flagrante e Patrícia, ré confessa, está há dois anos recolhida, ainda sem culpa formada.

A vida continua nos barracos podres de madeira, palafitas fincadas na maré, sem ventilação, telhas onduladas de calor insuportável e cheiro cloacal, onde impera o comércio do crack, cocaína, maconha. A droga chega, pequena multidão acorre, crianças e adolescentes aparecem, a droga traz dinheiro.

A gata teve a ninhada na mesma cama onde agora se misturam a avó, as três crianças e cinco gatinhos. Como sair dessa? Seu delegado, me ajude!

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Um comentário:

Anônimo disse...

Parabéns, governador, pelo conjunto literário desse artigo: clareza, concisão, foco e simplicidade.